Wednesday, May 30, 2007

Numa Qualquer Estrada Nos Sentidos…

Numa qualquer estrada
No sentido que me leva às obrigações,
Todos os dias,
Sempre que passo,
Há um menino segurando um balão.

Esquecendo por espaços os deveres,
Há a alegria de ver um menino segurando um balão
E gozando completamente,
Sem ter em mais que pensar,
A presença física do balão controlado por ele
Esvoaçar no firmamento.

Depois, continuo o meu caminho;
E longe já da imagem desse menino,
Na sua inocente e perfeita felicidade,
Sem máscaras nem obrigações,
Há a tristeza de saber
Que nem todos os meninos sabem
O que é um balão
E o que podem fazer com ele
E tudo o que um balão representa.

E muito mais triste que tudo isso
É a certeza clara,
Provada pela experiência,
Que esse menino, em breve,
Vai esquecer o balão
E com certo prazer vai usar uma máscara
E com um certo orgulho vai ter uma obrigação
E com toda a responsabilidade do Mundo
Vai ser infeliz…

(…)

Eu desisti de todas as obrigações;
Por isso não corro mais aquela estrada incerta
E a criança perdeu-se além do meu olhar.

Sempre que olho o céu
Procurando um sinal,
Na esperança ainda de ver o balão,
Não vejo mais do que os pássaros.

Ó tu que tens nojo da máscara
E desprezas como eu as responsabilidades!
Ó tu a quem faz falta a altura em que nada
Havia que pensar!

Se acaso correres a mesma estrada
E encontrares nela a criança,
Diz-lhe que não esqueça
A magia sublime de segurar um balão!
Assusta-a com a tua máscara
Como se fora o papão
Que ela de noite teme,
Como se fora a bruxa horrenda com que treme,
Como se fora Deus a vomitar!
Mostra-lhe os reveses da bonança!

Onde há a calma, há mudança,
Há tempestade no mar
Há tempestade no mar...

Lisboa, 11/05/93

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