Sunday, August 5, 2007

Ela Canta, Pobre Ceifeira!

Estar à janela olhando o Infinito.
Sentir a vida por fotografias.
Ouvir pianos na alma, (que bonito!),
Pensar em dias diferentes destes dias…

Ver o Mundo todo de um castelo de areia;
Encher a paisagem de recordações…

Quando estiver essa maré mais cheia
Talvez embarque, p’r’a lá das sensações…

Ter sido puro!
Ter sido inteiramente!
Ter sido sem receio do futuro!
Felicidade!
Oh!, ceifeira inconsciente!
Guia os meus passos!
Segura no meu braço!
Ensina-me tudo!

Crianças do meu passado
Com sonhos à ilharga,
Caminhai ao meu lado
Nas horas amargas!

Ensinai-me o truque,
A forma sagrada,
De sem ter destino
Saltar para a estrada,
Em busca do nada!

No céu o silêncio.
Em mim o desgosto.
Núvens várias condensam-se
Pouco a pouco.

Esqueçam-se
As coisas mundanas.
Esqueçam-se os sonhos terrestres.
Esqueça-se a vida do corpo –

Ascendamos.
Apago as coisas profanas,
Escolho este idílio campestre
E nele fico absorto
Até ao fim do programa,
Até ao grande apogeu.

Já nada sinto e de cama,
Ouço uma chuva a cair.
Que mais existe?
Há a mente que desvanece
E o tédio que subssiste
À vida na vida inteira.

(Não sendo é e persiste,
Não sendo é e chateia…)

Sou racional.
Nego tudo o que carece de prova.
E cantar e sentir são um sinal
De fuga à vida pesarosa.

Ou por Milagre estás alheia a ela?
Ou por Ventura esqueces o seu peso?
Se acaso o corpo dorme, a alma vela –
Estou sempre acordado, sei-me sempre preso!

Ah! Mas é vão o teu cantar na lida jornaleira?[1]
Às vezes queria esse inconsciente bréu
Que te deixa sem mal
Dizer que riste.

E eu nunca ri.
Nunca olhei o céu.

Oooooooohh!, gloriosa ceifeira! –

Fui então eu,
afinal,
O grande triste!

12/07/94 – 09/01/01

[1] Nota do Autor: A palavra Jornaleira foi empregue num sentido que penso estar mais próximo do etimológico. Entenda-se portanto: diária.

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