Friday, August 10, 2007

Numa Bebedeira

Porque são falsos os Homens!
Digo-lho eu, amigo, que os conheço:
Comem, comem, comem
Tudo quanto querem –
E depois partem, com corações de gesso…

Ferem tudo, amigo, sei que ferem!
Digo-lho eu, certinho, que sei tudo:
Pedem, pedem, pedem,
E se ninguém há, que os satisfaz,
Queimam casas e sonhos, e o pasto miúdo…

Não têm alma – Que a alma só tem paz.
Digo-lho eu, colega, que fui frade:
E eles catrapás, catrapás, catrapás!,
Golpeiam sempre, sempre dão estocadas
No peito da própria Liberdade!

Deliram!, são almas penadas!
Digo-lho eu que venho sempre ao tinto!:[1]
E «Alvoradas, alvoradas, alvoradas!
Brilhai em mim durante a noite inteira!»
Em vão o rogo pois só as trevas sinto…

Mas segue a vida, de qualquer maneira;
Um gesto meu é vão e indistinto:
«Alvoradas, alvoradas, alvoradas!»…
Gritá-lo mais? Não: Mais me ressinto.

E ao amigo também doi esse limbo
Que parecemos ter à cabeceira?
Perfeito! Basta! Nem pense em mais nada!:
Junte-se a mim, nesta bebedeira! –

Uma garrafa de vinho e a vida parada,
Uma garrafa de vinho e a vida parada…

O coração bate: Não, minto.
O coração bate: Não, minto.
É alguém à entrada.

Frape! Frape! Irra, o meu achaque!
Vá-se!, que ninguém está em casa!
Volte mais tarde,
Volte à terça-feira –
Talvez já tenha tido um aneurisma…
Vamos, coração bate!
Vamos, coração arde!
Upa! Upa! Baque! Baque!

Mas ele soluça e cisma,
Mas ele soluça e cisma…

(E a alma ainda gemendo baixinho:
«Alvoradas! Alvoradas! Alvoradas!»
E o peito ainda em busca de um ninho:
«Alvoradas! Alvoradas! Alvoradas!»
Mas nada lhe chega: Só um vento maninho:
E a noite que cai negra e pesada,
E a noite q
u
e c
a
i
negra
e pesada…).

Lisboa, 02/04/01

[1] Nota do Orador (em parentises): In vino veritas.

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